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Leigos Missionários Combonianos

Servindo a Missão ao estilo de S. Daniel Comboni

Leigos Missionários Combonianos

Servindo a Missão ao estilo de S. Daniel Comboni

Missão não é experiência, é VIDA

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Talvez a consciência que temos de nós próprios aqui diminuiu dada a grandeza do mundo ao qual te sentes chamado. Talvez a pouco e pouco nos fomos desapegando das coisas para nos apegarmos ao mundo, às pessoas, ao amor. Já não temos coisas. Já nada é nosso. Já não há nada que não possa ser dado, ser partilhado com todos os que caminham lado a lado connosco. Há muito que não somos só nós e que tudo o que somos é partilhado não só entre nós mas com o mundo. Somos parte de um todo que só tem sentido assim na partilha demorada dos dias e das vidas que somos e que sabemos ser juntos.

A paisagem traduz em muito a grandiosidade do que nos vai dentro, a grandiosidade dos pequenos milagres dos quais não somos apenas espectadores, somos o grão plantado em terra fértil, somos rega constante de vidas com sentido. Já não somos somente nós, somos mais que a soma das partes. Somos de Deus. Somos seu instrumento, somos as suas mãos, os seus pés e os seus abraços. Somos imperfeitas e feridas num mundo cheio de dor e de sofrimento onde porém com amor ousamos semear o paraíso do amor de Deus.

Em cada amanhecer saímos ao encontro do outro saímos do conforto do que não temos, nem a nós pertence vamos ao encontro do amor. Vamos na esperança que em cada rua ou esquina teremos sempre dois braços prontos a crescer connosco. Não somos nada e na nossa humildade somos o que de mais verdadeiro existe. Não conseguimos enumerar a quantidade de vidas que já cruzaram a nossa nem a quantidade de sorrisos, lágrimas e abraços que partilhamos na simplicidade da soleira da porta. É mesmo assim, o amor é despojado da superficialidade, é integro não tem cor nem raça, é porque é. E nós somos chamados diariamente a deixá-lo ser e crescer.

Damos a vida todos os dias sem horários, sem planos. Damo-nos. Tantas são as vezes em que deixamos os nossos planos porque Deus nos chama através de uma história. Tantas são as vezes em que sentimos que é o próprio Deus quem nos chama à porta através de tantos rostos, histórias e pessoas. Somos disponíveis ao amor que nos bate, que nos chama em cada momento. Somos disponíveis ao apelo de Jesus que sentimos que nos chama diariamente.

Somos terreno em crescente cultivo aberto ao cuidado do outro e aberto à possibilidade de crescer de mãos dadas no caminho de Jesus. Somos cruz carregada em ombros e braços de quem perdido não consegue caminhar. Isso é missão. Aceitar diariamente o convite de Jesus a um estilo de vida menos nosso e mais d’Ele. Não é fácil. Sabemos com a nossa vida que o caminho nada tem de fácil. Mas só assim para nós tem sentido.

Missão é vida, é a nossa vida, são as vidas deles e a vida que sabemos ser e doar no anúncio de um Evangelho vivo em cada um de nós. Somos em cada passo testemunhas de um Jesus que quer habitar na simplicidade dos nossos corações. É no saber-nos família, que cada dia, em cada visita, nos entregamos e somos mais.

A terra é árida e os montes que nos ladeiam são muitas vezes o caminho de muitos para a sua casa. Protegidas pela força imponente do vulcão Misti e Chachani de vara em mão atravessamos os limites do visível e partimos em busca do rosto de Deus nos mais distantes. Subimos e baixamos os montes, percorremos o caminho mais sinuoso. Ultrapassamos os limites físicos do nosso corpo que por vezes pede descanso. Ultrapassamos os nossos limites, certas de que é Ele a nossa força e a nossa vida. Certas que é nossa a missão de o levar e anunciar onde Ele já habita onde já há sementes d’Ele, onde já há Deus onde só falta quem lembre, quem O diga e anuncie. Ultrapassamos as nossas periferias para ir às periferias do mundo e aí ser símbolo de vida, de amor, ser símbolo d’Ele.

Não temos muito. Vivemos simples e humildes entre o povo de Deus. Somos com eles povo de Deus. Na simplicidade e pobreza da vida que levamos habita o tesouro nos vasos de barro de cada um dos nossos corações: o amor de Deus.

É bom, muito bom deixarmo-nos emocionar com todos aqueles que compõem hoje a nossa história. É bom ser apoio e ombro é bom ser lugar de refúgio é bom podermos ser Neuza e Paula em tudo o que somos e partilhar na simplicidade esse dom que é a nossa vida. E ajudar o outro a descobrir o dom da sua. Somos aqueles que nos chegam, somos dos que nos partem, somos dos que vêm e de todos os que deixámos. E passo a passo não descobrimos a missão, somos missão. Somos uma missão que não é nossa mas daqu’Ele que nos envia todos os dias a um amor maior.

Somos duas das mil vidas para a missão de Comboni. Juntas redescobrimos novas Áfricas, novas periferias. Não nos chega o pouco, não nos chega a planície do conforto. Vamos. Juntas vamos para lá dos montes, para lá de nós. Juntas vamos ao encontro das novas periferias, aquelas onde ainda não estamos e que ainda não chegámos. Soubessem vocês, soubéssemos nós quantas Áfricas faltam descobrir, quantas periferias existem sedentas de Deus, do seu amor e desse milagre de Amor que é a Eucaristia. Por isso estamos aqui. Por isso vamos ao encontro do amor fazendo da nossa vida a missão.

Na oração diária descobrimos os caminhos a seguir, descobrirmos a beleza de uma missão sem fim, sem fronteiras, sem limites. Ele é o limite. Na verdade, Ele não tem limites. Caminhamos na certeza de que não estamos sós pois são os seus braços que encontramos a cada amanhecer e fim de dia. Caminhamos na certeza de que chegamos sempre onde Ele nos espera. E ainda que o dia seja longo e muitas sejam as histórias de vida que nos chegam e nos fazem partícipes e muitas vezes sejam as lágrimas o que partilhamos uns com os outros. A resposta é sempre a mesma. Sim, Senhor, estamos aqui, leva-nos onde queres que estejamos. E ainda que a vida nos leve para longe daqui, somos Peru no mesmo amor que nos trouxe aqui e nos faz irmãos até fim.

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do Peru com amor,
Neuza Francisco & Paula Ascenção

Este Natal

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Ainda me lembro do cheiro molhado do Natal, do casaco vestido, das luzes cintilantes, reflexo da interioridade daqueles que vivem pelo espírito do mais amor.

Aqui é verão, o sol alumbra a magia dos sorrisos e das lágrimas partilhadas entre as vistas e os convites a ficar um pouco mais. O sol queima a paisagem e deixa transparecer a humanidade de um povo não esquecido mas lutador, deixa resplandecer o coração e a alma de todos os que me recebem de todos os que me chegam.

Aqui não sinto o cheiro dos pinheiros verdes nem o fumo da lareira acesa. Aqui o cheiro é de gente humana e humilde que partilha tudo o que tem contigo. Vivo rodeada de gente que, com o testemunho das suas vidas, acrescenta a minha e juntos somos mais de Deus. Um cheiro de espera e esperança que o amanhã, embora com dificuldades, será bem melhor que o hoje e uma vontade enorme de seguir em frente, sorrindo. Cheira a cozinha de quem prepara não uma grande ceia mas, o seu coração para receber a Jesus.

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Tenho tanto a aprender deles.

Deixo-me todos os dias comover com o testemunho das suas vidas. Vidas compostas por pessoas de carne e osso pessoas que com nada partilham o tudo e me moldam as lágrimas e os sorrisos desde aurora ao pôr do sol. Pessoas que me tocam o coração e me transformam. Não desejaria eu um Natal diferente se aqui, encontrei a família que Deus sonhou para mim. Este Natal desejo apenas ser abrigo dos corações que andam em busca de paz em busca de Deus.

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É, às vezes, esquecemo-nos que a verdadeira essência do Natal e da nossa vida está no reconhecimento diário que a nossa vida é um dom e que, o que fazemos dele, deveria ser uma opção diária pelo amor.

Neste Natal esquece os presentes com grandes invólucros e doa-te, como tempo para viver e partilhar com os que amas e busca o perdão junto daqueles que foram ao longo do ano um desafio para ti. Por aqui andarei de casa em casa a visitar aqueles que são e dão vida aos meus dias.

Neste Natal que a tua mesa seja farta, não de uma quantidade infindável de doces mas, de amor, esperança, carinho e união. Neste Natal, deixa-te ser luz na vida dos outros e agente de reconciliação e paz. Deixa-te pertencer e povoar por todos os que amas e que juntos possam agradecer o dom da vida. Neste Natal, permite que o teu coração humilde seja o berço onde renascerá Jesus.

É Natal onde quer que existe a coragem de sonhar, onde existe a ousadia de manter acordados os sonhos dos olhos fechados. Que a certeza do silêncio interior te inspire a viver uma descoberta de Deus em ti, nos outros e no mundo.

Neste Natal, farei como faço todos os dias e levarei o melhor de mim à Milágros e aos seus filhos, à Marcelina, à Célia, há Maria, à Valentina, à Ariana e os seus irmãos, ao Martim, ao Luís e a tantos outros aos quais o meu coração ardentemente me chama.

 

Votos de um Santo e Feliz Natal

Com amor e gratidão,

Neuza Francisco

Uma parte de mim chamada Peru

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Penso muitas vezes no sentido das vidas que cruzam o meu caminho. Penso muitas vezes na condição em que nos conhecemos e no quanto a simplicidade nos aproxima.

Podia enumerar uma quantidade infindável de situações que já vivi aqui. Muitas delas ultrapassadas e outras que viverei para compreender.

São já muitas as vidas que são minhas, são já muitos os sorrisos que me pertencem e os abraços que não nego e me restabelecem as forças. Na sensibilidade de apenas estar, deixo-me horas sem fim entregue às conversas de soleira da porta. A missão para mim não tem tempo.

A nossa casa tem as portas abertas, portas que se abrem para receber as maiores alegrias dos que passam e acolher os sofrimentos daqueles que buscam em nós o seu refúgio. Buscam de ti a única coisa que tens para dar, tu próprio.

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É quando a noite cai que mais gosto de rever os meus dias e ainda que muitas vezes me entregue às lágrimas, estas são de contemplação das maravilhas que Deus opera em mim e através de mim, é impossível não ver, é impossível não dar graças a Deus por tudo. São muitas as vezes em que revejo vezes e vezes sem conta os pequenos milagres e sinais que me chegaram através destas pessoas que agora são minhas.

A missão é dura, mentiria se vos dissesse que não. A missão é árida, aqui, onde a paisagem é coberta pelas chapas do que resta das casas que com os fortes ventos que se fazem sentir quase desabam. É, em Agosto parte de trabalho de um ano se desfaz quando a natureza sopra tão forte que é impossível resistir. Sem medo eles arregaçam as mangas sem desistir e, ainda que seja escasso o que têm, nada é mais forte que a vontade de continuar.

Não minto, a missão é dura. Muitas vezes chega a ser cruel, chega a doer. Ver o sofrimento no olhar destes meus irmãos e ver a incapacidade face a tantos desafios pelos quais ultrapassam. São tantas as vezes em que me limito a escutar, a dar a mão, o ombro. São tantas as vezes em que sorrimos juntos em que partilhamos esse amor de Deus tão concreto e livre ao mesmo tempo. São tantos os abraços as mãos estendidas. São tantos os momentos de silêncio e entrega ao outro na mais simplicidade de te sentares no seu chão e seres um com eles.

A missão é dura, sim. Foi nesta dureza que encontrei o sentido mais profundo da minha presença em terras peruanas. Foi nesta terra árida que depositei os meus sonhos e a minha esperança. É neste pequeno pedaço de mundo que oro dia após dia pela integridade e os direitos de um ser semelhante a mim, criado por Deus. É um constante estar frágil e entregares-te na simplicidade e humildade daquele que nada tem. Assim desinteressadamente.

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A missão é dura, mas é esta a missão que sempre sonhei é este constante descobrir quem sou e o que faço aqui. É este saber que não sou nada e ver frequentemente os milagres acontecerem assim, naturalmente. Numa confiança que nos faz carne da mesma carne.

Aos poucos tudo vai encontrando o seu lugar, aos poucos tudo acontece simplesmente nos tempos não humanos mas celestiais.

Com amor e gratidão

Neuza Francisco

Através de vocês Deus faz-me acreditar ainda mais no amor!

DSC_0073.JPGSão muitas as manhãs em que desperto pronta a fazer diferente, pronta a dar de novo o melhor de mim, pronta a deixar-me guiar em mais um dia de descoberta.

Não nego a vontade que tenho dentro de mim de mudar o mundo, não posso dizer-vos que o que se passa aqui, me é indiferente mas, em cada nova caminhada em terras peruanas desperto em mim o desejo de Deus por um mundo com mais amor.

Não, não vim aqui para trazer-lhes a fórmula secreta para a felicidade ou dizer-lhes o secredo de uma vida sem sofrimentos, até porque a fórmula é uma vida com Deus. Vim, anunciar-lhes que o amor é possível na luta diária pelas suas sobrevivências e nas sucessivas histórias de superação, que o sofrimento faz parte do caminho mas que Deus nos chama a ser felizes. Vim para partilhar convosco o que sou e pouco que sei de Deus. Vim para ser convosco. E se alguma dúvida houvesse eu aprendo convosco todos os dias que esse amor pouco a pouco transforma o nosso coração, dá vida às nossas vidas.

É nas visitas à Melchora e ao Policarpo que encontro um Cristo que espera sempre a nossa chegada, é na Maria que vejo um Deus que nos envia aos mais frágeis e abandonados, é no Leonardo que vejo o quanto Deus ama, atravessando os mundos humanamente construídos, ama a diferença de cada um de nós e está nessa mesma capacidade de sermos diferentes, de sermos nós. É na Soledade que vejo diariamente um testemunho de vida de serviço e entrega aos outros. É na Raquel que vejo um verdadeiro testemunho de Maria, mãe que apesar dos obstáculos duros leva a vida adiante só com os seus quatro filhos. No Juan encontro um Deus que espera o teu abraço e o teu sorriso, na alegria do anúncio do Evangelho com a vida, um Deus que te envia a ser vida na vida dos outros. Na Janet encontro a força no constante cuidar a família com amor. E é no olhar de esperança da pequena Ariana que encontro o sentido da minha presença aqui.

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É nos abraços que dou e recebo que todos os dias sinto os braços de Deus que me incentivam a levar dia após dia o Seu olhar misericordioso ao sofrimento dos meus irmãos e plantar neles a esperança não de um caminho sem dor, mas de uma presença que está, e se faz presente, em cada momento das nossas vidas juntos.

Estes são para mim os pequenos milagres da vida. Aqueles que nem sempre com a rotina dos dias conseguimos ver ou sentir. Sinto no silêncio das noites a presença misteriosa de Deus numa cultura que desconhece o amor como expressão bélica do dicionário mas que todos os dias são testemunho vivo de um amor que se doa e vive gota a gota.

E, no levar a vida em conjunto convosco encontro o sentido da minha missão. O sentido da partilha da vida e do querer em cada dia crescermos juntos num amor que não vive para ser falado mas para dar testemunho no serviço e entrega ao outro, no desafio de sermos nós e nos deixarmos moldar pela presença do outro.

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E, muitas vezes sem dizer uma palavra, ser parte da construção de um mundo melhor, de um mundo com mais amor possível e concretizável de dentro para fora.

Vocês são a prova viva de que o amor é possível e capaz, em nós e através de nós.
Com amor e gratidão
Neuza Francisco

A beleza da missão imperfeita

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“A grandeza da missão não está em nós, mas n’Aquele que nos envia”

(Pe. Ivo)

 

Um ano de missão. Quanto tempo cabe neste tempo? Quantas vidas couberam nas nossas vidas? Quantos braços couberam nos nossos braços? Quanta vida demos. Quanta vida recebemos. Deixamos de planear a vida para permitir que a vida nos planeasse, para deixar que Deus nos tocasse e as pessoas nos encontrassem. Deixamo-nos encontrar tal e como somos nas nossas feridas, cicatrizes e imperfeições. Assim somos, assim nos entregámos à missão juntas e imperfeitas. Caminhámos certas que “todos estamos feridos, é por aí que entra a luz” não quisemos nunca ser perfeitas. Pelo contrário deixámos que Deus tocasse na nossa imperfeição e dela fizesse caminho até aos irmãos, agora amigos e vizinhos. Agora a nossa família.

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A beleza de uma missão imperfeita está em nós, reside em nós. A beleza não está no momento instantâneo em que te apercebes que a tua missão és tu mesmo e a tua vida mas sim, na capacidade de fazer caminho contigo e pouco a pouco sem medo e deixando que as tuas feridas, cicatrizes ou fragilidades transpareçam como algo que também constitui o teu ser, algo que faz parte. A missão é assim, um caminho a um, contigo mesmo, a dois, porque tu sabes que foste escolhido por um amor maior, a três tu Deus e o outro, na certeza de que o outro existe para fazer caminho contigo.

Permites-te ser, permites conhecer um pouco mais de ti e deixares-te descascar pouco a pouco, e chegar ao outro sempre pronto a caminhar com ele. E, neste seres tu frágil de mão dada com Deus, chegas ao outro e outro chega-te da forma mais imperfeita e completa. É neste caminho a três que encontramos os outros, os irmãos. Os que agora são a nossa casa e caminham connosco. São eles que de forma imperfeita nos completam, aumentam e acrescentam. É o ser imperfeitos que nos faz encontrar os outros caminhando e crescendo com cada pessoa que cruza o nosso caminho. Desta maneira, missão não é somente ensinar ou aprender mas caminhar e crescer juntos sabendo que a imperfeição das partes forma a perfeição do todo. Assim é a lógica de Deus que nos fez de tal maneira que necessitássemos do outro para amar, ser, viver e ser feliz.

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LMC Paula e Neuza

Jornal “Caminho - notícias da missão no Peru

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Partilhamos mais um pedaço do Jornal Caminho de Abril da Paróquia de Cristo Rei da Vergada.  Hoje com notícias do Peru pela LMC Neuza Francisco. 

Amar é a partida

 

 

Desde que cheguei aqui, tenho descoberto a cada dia que passa, o amor. Um amor que exigiu e exige continuamente uma partida, uma partida de nós próprios, uma partida de tudo o que já conhecemos, uma partida que exige que te ponhas a caminho. Precisamos amar o mundo e tudo o que n’Ele espelha o amor de Deus. Aqui encontrei uma outra forma de amar, encontrei um amor disponível, um amor simples, um amor que brota da honestidade do que tenho e do que partilhando permitimos doar e receber do outro. Assim de forma desinteressada. Um amor que brota de um crescer juntos, como irmãos. É aqui que sinto ardentemente que tenho que estar. É neste irmão que sinto todos os dias o chamamento de Deus. É nas subidas e descidas dos grandes montes que me rodeiam que encontro constantemente sorrisos, lágrimas, encontro braços que me esperam, olhos que refletem história, muita história.

É por estes caminhos de terra que todos os dias caminho, que encontro testemunhos que me convertem e me fazem agradecer a Deus, o milagre da vida. Agradeço, ter sido uma das suas escolhidas. Pouco a pouco, vou conhecendo não apenas os seus rostos, a sua expressão, vou conhecendo cada nome, cada casa, cada família. Já são muitas as vezes em que escuto de longe que me chamam “Andrea, hermanita Andrea”. Sim aqui todos somos irmãos e irmãs.

Um dia vos contarei a história do meu nome. Sinto-me um deles. Somos uma família.

Ai Peru, que roubaste o meu coração!

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Na partilha do que têm, sim, dão-te muitas vezes do pouco que têm e do muito que são. Fazem questão. São muitas as vezes em que no regresso, trago o regaço cheio com meia dúzia de maçãs do senhor que vem ao encontro de idosos, com uma banana que durante o caminho o senhor da pequena mercearia me ofereceu, com os grãos de milho que me ofereceu uma das famílias que visitei ou com duas ou três batatas, da senhora que estava doente, me ofereceu.

Aceitamos a cada dia crescer juntos. Aceitamos a cada visita, ajudar-nos a carregar a cruz de cada um. Somos palavras de aconchego mútuo, somos sorrisos, somos silêncios que se confessam, somos lágrimas. Somos, na consequência do ser-se, frágeis e muitas são as vezes em que de joelhos nos reconciliamos com o amor.

Na humildade de cada pessoa que cruza o meu caminho que encontro o rosto de um Deus, um Deus misericordioso.

Na alegria e na dor do dia a dia encontro o sentido da vida. E cada vez que ao longe, avisto uma família, um conjunto de crianças que me esperam, avisto dois braços, os braços de Cristo.

Neuza Francisco, LMC

Em Missão, no Peru

Teatro solidário - uma fonte de vida

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Partilho convosco aquela que é a minha imagem matinal. Aquela imagem da minha cidade, Linda Leiria, que funciona agora como pano de fundo sobre a minha manhã de desporto na qual encontro também Deus e com Ele converso. Dialogamos sobre aquilo que decorreu no dia 4 de Março na “minha” paróquia de Santa Eufémia - um Teatro Solidário levado ao palco pelo TASE (Teatro de Animação de Santa Eufémia): Comédia a partir das Lendas de Leiria. E quão grata estou ao nosso Pai. N’Ele confiei este Teatro. E quantas não foram as vezes que me achei incapaz. Á memória muitas vezes me vinha o meu compromisso de Quaresma que assumi numa oração shemá (orações que decorrem em Leiria, onde se privilegia o canto e a oração meditada, com inspiração nos métodos de Taizé). Confiar. Confia pois “tudo podes n’Aquele que te dá força (Filipenses 4:13)”. Confia pois “Deus nunca pede nada que antes Ele já não te tenha dado”.

 (https://www.youtube.com/watch?v=tlvJehSct4g)

Enquanto corro, reavivo os momentos em que desanimei porque as coisas não estavam a correr tão bem quanto queria. Mas queira eu o que Deus quer, e acima de tudo, que este evento traga os frutos necessários à obra do Senhor, à missão em Arequipa (Projeto Ayllu) e não mais que isso.

E é difícil agradar a todos. Quero crer que tudo o que fiz foi pela Obra do Senhor. Afinal de contas, Jesus nem sempre agradou a todos. E quão difícil é, por vezes, encarcerar em nós as críticas (construtivas ou não) e acatá-las em silêncio. “Podias fazer a, ou b. Mas também poderias fazer c. Ou talvez d”. E peço perdão pelas reacções menos positivas que tive para com aqueles que, embora eu não visse de forma nítida, me queriam somente ajudar. E devo-lhes tanta graça!

 

Agarrar este evento em nome dos Leigos Missionários Combonianos foi vida. Foi vida que se gerou, não só em mim, mas também vida que se gerou em torno de relações humanas, de pessoas que querem dar(-se). E vejo com este meu olhar crente no mundo que todos (TODOS) somos capazes de amar, todos temos uma ALMA MISSIONÁRIA e (ainda que muitas vezes nos nossos recônditos) esta necessidade de amar e ser amados. E é este Amor que deve ser o motor da vida!

 

Nas semanas precedentes ao teatro fomos convidando pessoas. Muitos "Não posso", alguns "Não vou, mas compro o bilhete", uns quantos "Não sei se vou", "Eu vou", “Afinal não posso ir". Um misto de altos e baixos que foram tecendo uma plateia. Na verdade, estava com receio que a plateia também não fosse apelativa ao próprio TASE (afinal de contas, actuar num palco faz-se com mais gosto e empenho se o público for numeroso e recetivo). Contas feitas, rezava para que, pelo menos 50 pessoas preenchessem os bancos daquele auditório.

Confia Carolina. Ecoava em mim esta frase.

Soubessem a emoção contida no meu coração quando, nesta tarde de Domingo que já ansiava há tanto tempo, surgem para ver o teatro cerca de 130 pessoas. E não posso deixar de agradecer aos presentes, mas também aos que estavam de outra forma, em oração, espiritualmente, em pensamento. Agradeço também ao TASE que de forma tão gratuita e generosa se dispôs a pôr o seu talento teatral a render, colocando a plateia a rir às gargalhadas (eu própria chorei a rir!). Agradeço aos vários patrocinadores (uns mencionados nos flyers, outros que preferiram o seu anonimato). E acima de tudo, agradeço a Deus pelos frutos deste Teatro Solidário que, muito além de financeiros*, são frutos vivos nas relações que se estabeleceram, no diálogo envolvido para a sua concretização, nos pensamentos que surgiram na cabeça de cada um dos colaborantes quando decidiram contribuir. Muito obrigada a todos!

Do fundo do meu coração, o meu mais profundo obrigada. E aqui nasceram mais “mil vidas para a missão”! Estou certa que em tudo o que fizemos teve a mão de Deus e de um amigo nosso, São Daniel Comboni.

LMC Carolina Fiúza

*1020€ de receita conseguida na venda de bilhetes, patrocínios, donativos e venda de artigos

 

Estar aqui. Com eles e entre eles!

22790782_10215031450241977_2067650889_o.jpgEstamos num dos lugares mais bonitos do mundo. Apenas deveremos acrescentar que neste lugar, algures, perdido entre os vulcões Chachani e Misti, vive um povo, um povo humilde no qual fazemos morada agora.

Ao longo da nossa ainda precoce caminhada, são já muitos os rostos que ficaram cravados em nós. Talvez porque a desumanidade se faz presente de uma forma tão evidente que em última das hipóteses leva à morte. São já muitas as histórias de violência que nos foram contadas não apenas através de palavras, mas através do testemunho vivo de quem diariamente luta pela esperança da mudança. Ou não seja este país, Peru, o país onde os níveis de machismo são dos mais elevados de mundo. Neste testemunho de Manu Tessinari, podemos conhecer de uma forma mais profunda esta realidade:

 

“Peru é um país machista. Muito machista.

No Peru, uma adolescente pode ser espancada pelo pai se flagrada tendo sexo com o namorado. Aqui, a mulher que está em cárcere não tem direito a visitas conjugais. No sistema público de saúde, é proibido a entrega gratuita da pílula do dia seguinte para pacientes vítimas de estupro.

22641683_1205471326251727_267057887_o.jpgAlgo mais absurdo? No Peru, se a mulher é largada pelo marido e não se divorciam, o homem pode refazer a vida e registrar todos os filhos da nova companheira. A mulher não. A lei indica que o filho desta mulher é legalmente do ex-marido (protegido pelo vinculo do matrimonio) e para que o pai biológico consiga registá-lo, é necessário um longo e complexo processo legal.

De 10 mulheres peruanas, 6 são vítimas de violência psicológica e 2 são vítimas de violência física por parte de seu companheiro. 16% das pessoas (homens e mulheres) acham que a culpa é da própria mulher, sendo que 3,7% acham que elas MERECEM ser golpeadas e 3,8% NÃO vêem problemas em o homem forçar relações com suas parceiras.

As peruanas são trabalhadoras. Segundo o INEI (Instituto Nacional de Estatísticas e Informação), 95,4% das peruanas trabalham, a maioria em serviços. Em média, uma peruana ganha UM TERÇO A MENOS do que um peruano ganho, fazendo o mesmo serviço. Infelizmente, somente 36% das mulheres conseguem terminar a escola e pouco mais de 16% conseguem concluir uma faculdade. Isto num país onde as mulheres são 15.800.000, ou seja, 49,9% da população”.

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As vidas de quem nos passa pela porta, não nos ficam indiferentes, e ainda que a realidade seja esta, levamos-lhe a alegria de um Evangelho que não é apenas nosso, um Evangelho que necessita ardentemente de ser levado ao mundo, levado aos confins da periferia.

 

Não tenhais medo de sair e ir ao encontro destas pessoas, de tais situações. Não vos deixeis bloquear por preconceitos, por hábitos, por inflexibilidades mentais ou pastorais, pelo famoso «sempre fizemos assim!». Mas só podemos ir às periferias, se tivermos a Palavra de Deus no nosso coração e se caminharmos com a Igreja, como fez são Francisco. Caso contrário, estamos a anunciar a nós mesmos, e não a Palavra de Deus, e isto não é bom, não beneficia ninguém! Não somos nós que salvamos o mundo: é precisamente o Senhor que o salva!

- Papa Francisco -

 

É aqui que nos sentimos chamadas a habitar entre eles e com eles. É aqui que deixamos de ser nós para ser, instrumentos vivos ao serviço de Jesus Cristo no Peru.

 

 

Comunidade Ayllu,

Neuza y Paula

A nossa casa - Notícias das LMC Paula e Neuza

Chegar à missão é chegar a casa. Não a que nos viu crescer, outra que agora nos acolhe, onde agora dormimos, crescemos e amamos. Chegar à missão é chegar ao povo. Não o que nos viu nascer, outro que nos recebe de braços abertos como se fossemos filhas que tornaram a casa. Chegar à missão é abraçar outro povo. Não aquele que nos viu nascer mas aquele que de braços abertos se predispõe a crescer connosco. Cada pessoa é mundo e tem mundo para nos contar. Em cada pessoa encontramos Deus e é esse Deus e esse mundo que hoje pretendemos mostrar-vos. É nesta paisagem que todos os dias acordamos na confiança e adormecemos no agradecimento. Nesta missão que não é só nossa mas de todos, queremos que percorram cada dia e cada história connosco.

 

LMC's Paula e Neuza

 

 

A missão do outro lado do atlântico

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Ter fé é assinar uma folha em branco e deixar que Deus nela escreva o que quiser (Santo Agostinho). 

Assim também a missão é deixarmo-nos guiar pelo espírito santo que nos acompanha e espera. 

Chegamos a este caminho com tudo o que somos e assim também partimos. Trouxemos no coração todos os que amamos e nos completam, fizeram-nos chegar até aqui e acompanhar-nos-ão a vida toda, assim dita o amor. Saímos ao amanhecer e também num amanhecer chegámos ao Peru. Conscientes da longevidade da viagem fortalecemo-nos nos abraços que apertados se deram neste longo até jáChegámos à terra à qual chamaremos casa nos anos que se aproximam. 

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À porta do aeroporto já nos esperavam, nos sorrisos e na alegria de finalmente nos receberem. Partilhámos o nosso nome e o nosso carisma. 

Á saída, fomos recebidas pela chuva miudinha que se fazia sentir, e neste turbilhão de sensações percorremos pela primeira vez solo peruano. O período é de puro conhecimento, despojadas de nós damos os primeiros passos junto deste povo que nos acolheu de forma tão amável. Somos nós do outro lado do atlântico vivendo a missão bem ao estilo S. Daniel Comboni. 

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Conhecer os Leigos Missionários Combonianos foi conhecer a nossa família LMC Peruana. Cada um deles partilhou connosco um pouco de si e do seu testemunho de vida e de fé. Pudémos conhecer também os postulantes com quem convivemos e partilhámos bons momentos. Entre conversas, bebidas, comidas e gargalhadas recebemos um pouco deles e demos um pouco de nós, alegres, na certeza de saber que todas estas vidas convergem para Deus. 

Certas de que foi e é Deus quem nos chama a esta missão. Caminhamos juntas certas que chegaremos aonde nos esperam.

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Neuza y Paula